Homilia do Papa Francisco de 22-10-2013 sobre a sobre a
contemplação, a proximidade e a abundância.
Deus não nos salvou por decreto ou por lei; nos salvou
com a sua vida. Este é um mistério que
não pode ser compreendido só com a inteligência; mais do que isso, tentar
explicá-lo só com o uso da inteligência significa arriscar-se à loucura. Para entendê-lo necessita-se de outra coisa.
A passagem da Carta aos Romanos (12; 15; 17-19; 20-21)
talvez seja uma das mais difíceis. Vê-se que ao próprio Paulo lhe custa
proclamar, fazer-se entender. De
qualquer forma, ele nos ajuda a acercar-nos da verdade. E, para facilitar nossa compreensão, três
palavras são importantes: a contemplação, a proximidade e a abundancia.
Antes de mais nada, a contemplação. Sem dúvida, trata-se de um mistério
extraordinário, tanto que a Igreja, quando quer nos dizer algo sobre este
mistério, usa somente uma palavra: admiravelmente. “Ó Deus, Tu que admiravelmente criaste o
mundo e, mais admiravelmente o recriaste...”.
Paulo quer fazer-nos entender precisamente isto: para
compreender, é preciso se colocar de joelhos, orar e contemplar. A contemplação é inteligência, coração,
joelhos, e oração; e, colocar tudo isto junto significa entrar no
mistério. Portanto, o que São Paulo diz
a propósito da salvação e da redenção realizada por Jesus somente se pode
entender de joelhos, em contemplação; não unicamente com a inteligência, porque
quando a inteligência quer explicar um mistério, sempre enlouquece. Assim se sucedeu na história da Igreja.
A segunda palavra é a proximidade. Um conceito que, no Evangelho, é repetido com
frequência. Um homem cometeu o pecado,
outro homem nos salvou. É um Deus
próximo. Este mistério nos mostra a Deus
próximo de nós, de nossa história; desde o primeiro momento, quando escolheu o
nosso pai Abraão, caminha com o seu povo, e enviou Seu Filho para realizar esta
obra.
Uma obra que Jesus realiza como um artesão, como um
operário. A imagem que me vem à mente é
a de um enfermeiro ou enfermeira que, em um hospital cura as feridas uma a uma,
mas com as suas mãos. Deus se envolve
com nossas misérias, aproxima-se de nossas feridas e as cura com as suas mãos;
e, para ter mãos, fez-se homem. É um trabalho
de Jesus, pessoal: um homem cometeu o pecado, um homem vem curá-lo. Porque Deus não nos salva solo mediante um
decreto, com uma lei; salva com ternura, salva com carinho, salva com a sua
vida por nós.
A terceira palabra é abundância. Na Carta de Paulo, repetem-se várias vezes:
onde abundou o pecado, superabundou a graça.
Que o pecado abunda no mundo e dentro do coração de cada um é evidente. Cada um de nós sabe de suas misérias,
conhece-as bem. E elas abundam. Mas o desafio de Deus é vencer o pecado,
curar as feridas como fez Jesus. Mais
ainda: dar o presente superabundante de seu amor e de sua graça.
Assim se entende também a preferência de Jesus pelos
pecadores. Acusavam-no de ir sempre com
os publicanos, com os pecadores. Comer
com os publicanos era um escândalo, porque no coração desta gente abundava o
pecado. Mas Ele ia na direção deles com
aquela superabundância de graça e de amor.
E a graça de Deus vence sempre porque é Ele mesmo que se doa, que se
aproxima, que nos dá carinho e que nos cura.
É verdade que há quem não gosta de escutar que os
pecadores são mais próximos ao coração de Jesus, que Ele vai buscar-los, chama
a todos: venham, venham... E quando Lhe pedem uma explicação, Ele diz: mas os
que têm boa saúde não necessitam de médico; vim para curar, para salvar em
abundância.
Alguns santos dizem que um dos pecados mais feios é a
desconfiança, desconfiar de Deus. Mas
como podemos desconfiar de um Deus tão próximo, tão bom, que prefere nosso
coração pecador? E assim é este
mistério: não é fácil entendê-lo, não se compreende bem, não se pode entender
só com a inteligência. Talvez nos ajudem
estas três palavras: contemplação, contemplar este mistério; proximidade, este
mistério escondidos nos sinais do Deus próximo e que se aproxima de nós; e
abundância, um Deus que sempre vence com a superabundância da sua graça, com a
sua ternura, ou, com a riqueza de sua misericórdia.