segunda-feira, 21 de outubro de 2013


A virtude do ZELO segundo São Vicente de Paulo

(retirado do livro “Liderança Mística”, a ser publicado em novembro de 2013)


Para Vicente de Paulo, zelo é o "amor em fogo", o que significa a paixão de trabalhar incansavelmente para realizar a vontade de Deus, para "transformar corações", para servir os Pobres, para evangelizar, e para encorajar outros a fazer o mesmo.

Pe. Robert Maloney, ex-Superior Geral da Congregação da Missão, propõe algumas formas práticas para exercitar o zelo:


1. O zelo se expressa em nosso dia-a-dia.

Mais e mais o cristão percebe que, às vezes, é mais difícil viver pelo Cristo que morrer por Ele. Seu zelo se mostra na vontade de continuar a fazer a vontade de Deus, especialmente no desencorajamento do dia-a-dia: é preciso despertar todos os dias, agradecer a Deus pelo dom da vida e recomeçar a nossa missão. 


2. O zelo se expressa na vontade de buscar mais operários para a colheita.

O amor é infectuoso e o zelo é o fogo que o espalha. O amor em chama deve buscar se comunicar com os outros, fazê-los sentir o mesmo fogo, assumir o mesmo zelo pela missão de servir.
 

3. O zelo faz do cristão um empreendedor social efetivo, pela confiança na Providência Divina.

Se a nossa vontade é de servir a Deus, então tudo virá Dele – é o Seu trabalho, não o nosso.  Santa Teresa de Calcutá dizia que “nunca foi entre nós e os homens, mas entre nós e Deus”.  Se é uma obra divina, alcançará os objetivos, conseguiremos superar nossas próprias fraquezas, conseguiremos empreender e obter os resultados a que nos propomos.
 

4. O zelo faz do cristão um empreendedor social efetivo, pela a inovação pela experiência.

Para São Vicente, o “amor é inventivo ao infinito”.  A vivência com os pobres, através da virtude, nos faz ser criativos para servir, assim como Deus é conosco (sempre nos surpreende com um plano melhor do que o nosso). Para isso, devemos nos questionar sempre se não há uma forma mais inteligente de alcançar nossas metas, de empreender, de servir, de dar dignidade e liberdade ao Pobre. 


5. O zelo faz do cristão um empreendedor social efetivo, pela espera no tempo de Deus.

As prioridades divinas são baseadas na perfeição da sabedoria e a nossa percepção do tempo não necessariamente é a mais precisa e necessária. Deixemos que Deus decida sobre o melhor momento!

domingo, 13 de outubro de 2013


A virtude da MANSIDÃO segundo São Vicente de Paulo
(retirado do livro “Liderança Mística”, a ser publicado em novembro de 2013)

Para São Vicente de Paulo, a mansidão e gentileza (ou "douceur") é a capacidade de ser firme, mas controlar e gerenciar a raiva. Implica também em suportar ofensas com perdão e coragem.

Para ele, a mansidão deve ser motivada pela genuína vontade de imitar e servir a Cristo: “Aprendei de mim que sou manso e humilde de coração” (Mt 23,1-12).

Vicente de Paulo inspirou algumas definições de mansidão na vida prática, as quais são apresentadas por Robert Maloney:

1. Mansidão representa a habilidade de tratar a raiva de forma positiva.

Como todas as emoções espontâneas, a raiva pode ser utilizada bem ou mal: concretamente, todas as pessoas têm dificuldade de tratá-la de forma efetiva.

Conforme indicava Vicente de Paulo, lidar bem com a raiva significa expressá-la de forma apropriada; ele mesmo teve que controlar seu próprio temperamento colérico, enfocando-o na reação às necessidades dos Pobres, com vigor e criatividade.

Também expressou raiva de forma simples, quando percebeu a existência do mal em suas comunidades, mas aprendeu a combinar a sua raiva com a sua gentileza, o sabor amargo com o doce: buscava imitar a Cristo que era ao mesmo tempo gentil e firme. De fato, Jesus sabia moderar seus momentos de frustração em relação aos apóstolos e expressou claramente sua raiva em relação aos fariseus em diversas ocasiões.

2. Mansidão significa proximidade e calor humano.

Estas são qualidades importantes, especialmente para os servidores dos Pobres. Neste aspecto, Vicente de Paulo nos encoraja a ser confiantes de que podemos mudar, citando sua própria experiência.

Os que o conheceram em sua idade madura indicaram que ele era uma pessoa que expressava enorme calor humano. Costumava dizer aos membros de suas comunidades que as pessoas são “ganhas” muito mais pela mansidão do que pela argumentação.

3. Mansidão significa a habilidade de tratar ofensas com perdão e coragem.

Vicente de Paulo baseava seus ensinamentos sobre este assunto no respeito aos outros como pessoas humanas: mesmo os que cometem injustiça merecem respeito.

Os escritos de João Paulo II reiteram esta máxima nos dias de hoje: o chamado a ter profunda reverência a todo o ser humano, mesmo que nos ofenda. Naturalmente, ter respeito pela pessoa do ofensor não nos proíbe de canalizar nossa raiva com coragem, contra o mal que o ofensor comete, mas deve nos guiar a não cometer injustiça em nome da injustiça. João XXIII dizia que “devemos odiar o pecado, mas amar o pecador”.

Vicente de Paulo reconhece claramente - e recordou a Philip LeVacher sobre o ensinamento de Santo Agostinho sobre este tema - que existem males que devem ser tolerados, uma vez que não há possibilidade de os corrigir. Assim, devemos aprender a viver com eles, tratando com respeito as pessoas que não conseguem se livrar deles: deixar que Deus os trate e os converta em benefícios.

4. Mansidão significa agir com coragem em nome da justiça e da paz.

João Paulo II expressa a dualidade dos meios da construção da paz em sua encíclica Centesimus Annus , dualidade que deve priorizar o desenvolvimento dos povos e eliminar toda a tentativa de guerra.

Ele diz: “Nunca mais a guerra. […] O outro nome da paz é o desenvolvimento. Como existe a responsabilidade coletiva de evitar a guerra, do mesmo modo há a responsabilidade coletiva de promover o desenvolvimento. Como a nível interno é possível e obrigatório construir uma economia social que oriente o funcionamento do mercado para o bem comum, assim é necessário que hajam intervenções adequadas a nível internacional. Por isso deve-se fazer um grande esforço de recíproca compreensão, de conhecimento e de sensibilização da consciência. É esta a cultura almejada que faz crescer a confiança nas potencialidades humanas do Pobre e, consequentemente, na sua capacidade de melhorar a sua condição através do trabalho, ou de dar uma contribuição positiva ao bem-estar econômico. Para fazê-lo, porém, o pobre — indivíduo ou Nação — tem necessidade de que lhe sejam oferecidas condições realisticamente acessíveis. Criar essas ocasiões é a tarefa de uma concertação mundial para o desenvolvimento, que implica inclusive o sacrifício das situações de lucro e de poder, usufruídas pelas economias mais desenvolvidas”.

Esta é uma possível missão para todo o cristão que tem uma responsabilidade pública ou privada na construção da paz.

domingo, 6 de outubro de 2013

A virtude da MORTIFICAÇÃO segundo São Vicente de Paulo


A virtude da MORTIFICAÇÃO segundo São Vicente de Paulo

(retirado do livro “Liderança Mística”, a ser publicado em novembro de 2013)

 

Para São Vicente de Paulo, a mortificação significa controlar os sentidos, as paixões e as emoções, não permitindo que elas prejudiquem o alcance racional de nossa missão no mundo. Em certo sentido, significa manter-se enfocado nos resultados e decidir de acordo com a razão.

 

A mortificação, portanto, traduz-se na prática da “desconexão” de si mesmo para bem compreender a vontade de Deus, através da contemplação na ação, ou seja, a escuta do plano de Deus, através dos fatos da vida.  Para isso, é necessária a mortificação aos pré-conceitos e aos interesses pessoais: é como “despir-se do homem velho, para revestir-se do homem novo” (Cl 3, 9-10).

 

Vicente de Paulo dá também a perspectiva à mortificação como “desconexão do mundo”, mas em nome de Cristo: “Senhores, mantenhamos este exemplo diante de nossos olhos. Nunca percamos de vista a mortificação de nosso Senhor, considerando que, para segui-lo, somos obrigados a mortificar a nós mesmos. Modelemos nossas afeições às Suas: que os seus passos sejam os guias para os nossos, no caminho da perfeição. Os santos são santos porque caminham em seus passos, renunciam-se a si mesmos e mortificam-se em todas as coisas” .

 

Em outras palavras, quando fazemos silêncio como resposta a uma provocação maledicente, quando não damos valor excessivo às coisas materiais, quando negamos os sentidos interiores e exteriores ou as paixões da alma, o fazemos por causa de Cristo.

De fato, como São Vicente de Paulo ensinou às Filhas da Caridade, mortificação e oração caminham juntas: “Oração e mortificação são duas irmãs que são tão unidas que uma nunca será encontrada sem a outra. A mortificação vai primeiro e a oração a segue, de forma que, minhas caras irmãs, se vocês desejam se tornar filhas da oração, como deveriam, aprendam a mortificarem a si mesmas”.

 

Mortificação não é autoflagelação. A mortificação é uma expressão da vontade sana de desconexão do mundo e dos prazeres, para refletir e agir de forma mais produtiva e enfocada. A autoflagelação pode ser uma busca insana de oportunidades para sofrer e mostrar a nós mesmos - e aos outros - que estamos sofrendo.

 

O Pe. Robert Maloney CM, ex-superior geral da Congregação da Missão, propõe algumas formas práticas para exercitar a mortificação:

 

1. Equilibrar nossos valores - fazer escolhas.

Isto significa renunciar uma coisa para fazer ou ter outra melhor. Por exemplo, renunciar ao excesso de bebida, para o benefício da saúde espiritual, mental e física.

 

2. Estar pronto(a) para responder à vontade de Deus, particularmente, aceitando tarefas difíceis.

Frequentemente, responder a desafios faz-nos descobrir capacidades e recursos que temos e que nunca nos tínhamos dado conta, sendo, portanto, uma prática saudável para a nossa maturação.

 

3. Trabalhar arduamente e dedicar tempo generosamente, como bons servidores fazem.

Por exemplo, aceitando afazeres simples para o bem comum, ou usando nosso tempo de forma generosa, para servir aos outros.

 

4. Acordar cedo para rezar.

É importante rezar de forma disciplinada, estabelecer um tempo específico para a oração diariamente e criar o hábito da meditação.

 

5. Ser resiliente. Ou seja, enfocar nas metas estabelecidas com disciplina.

Aceitar frustrações conosco mesmos, quando não somos capazes de fazer as coisas como planejamos.  Michelangelo fez inúmeras tentativas não utilizadas da Pietá, antes de finalizar a famosa escultura, como conhecemos hoje.

Aceitar frustrações com os outros - como, por exemplo, oposição ou não reconhecimento.  

 

6. Ser fiel às responsabilidades quando conflitam com o prazer.

Optar pelas atividades relacionadas às responsabilidades de nossa situação profissional, social ou familiar, no lugar de coisas que levam a retornos imediatos do lazer, pode ser uma vivência de mortificação, especialmente no mundo em que vivemos hoje, que privilegia o prazer a todo o custo.

 

7. Ser restrito na aquisição ou aceitação de bens materiais.

Ter um estilo de vida simples, sem exageros na busca de roupas, dinheiro ou outros bens materiais, mas possuí-los sem ser “escravos” deles é viver a mortificação.   Como diz São Paulo: “os que choram, como se não chorassem; os que se alegram, como se não se alegrassem; os que compram, como se não possuíssem; os que usam deste mundo, como se dele não usassem. Porque a figura deste mundo passa” (1 Cor 7,29-31).

 

8. Não dar valor a privilégios especiais.

Manter-se no limite do que é normal e fora das exceções é uma virtude que demonstra elevada autoestima.

 

9. Evitar palavras de crítica destrutiva ou que gerem divisões entre pessoas de nosso ambiente.

Este hábito pode ser uma tremenda ajuda não só ao nosso crescimento dentro da mortificação, como também à caridade. São Bento dizia que o murmúrio era o grande vício dos mosteiros. Vicente de Paulo percebia o mesmo perigo.

É uma norma saudável conter críticas, a menos que elas possam ser proferidas de forma positiva, dentro da simplicidade vicentina, aos que as podem utilizar para seu próprio desenvolvimento como pessoas.

 

10. Dar atenção aos que necessitam dela.

Normalmente, buscamos estar com quem tem poder, gloria ou dinheiro: estas pessoas são mais interessantes e estão sempre na moda. Dedicar tempo àquelas pessoas que nos dão menos prazer porque são marginalizadas em nossos ambientes de trabalho e lazer é uma prática da caridade e da mortificação.